Advogada e agente de execução, Marta Marinho, 42 anos, é, também, presidente da Junta da União de Freguesias de Olo e Canadelo e presidente da Banda Musical de Amarante. Parece viver a vida ao minuto, mas diz guardar para a família os seus melhores momentos, que, não sendo muitos, são vividos com intensidade!
Era agosto e, naquele sábado, o recreio da antiga escola de Olo recebia a Festa do Emigrante, evento que já não se realizava há oito anos. Havia, por isso, alguma expectativa sobre a adesão de quem, sendo de Olo, está na diáspora, embora do lado da organização se acreditasse numa “boa casa”.
Estava a noite prestes a cair e, com cerca de sete a oito dezenas de emigrantes já em confraternização, chegou ao local, discreta, ladeada pelo marido e pelo filho de cinco anos, a presidente da União de Freguesias de Olo e Canadelo. A família, explicou-nos alguns dias depois, acompanha-a sempre que é possível e a informalidade das suas saídas o permite. A razão é simples: com o tempo muito preenchido, aproveita todos os momentos que pode para estar com os seus.
“Aliás, explicou, faço uma gestão muito regrada e criteriosa da minha vida, para que todo o tempo livre seja dedicado à família. Podendo não ser muito, é, porém, vivido de forma intensa”, garante.
Marta Inês Ribeiro da Costa Marinho, 42 anos, parece, de facto, viver a vida ao minuto. Advogada e agente de execução, com escritório na cidade, é, também, para além de autarca, presidente da Direção da Banda Musical de Amarante, desde 2013. Desdobra-se em atividades e compromissos, mas é perentória: “Nunca digo que estou a perder tempo na Junta ou na Banda. Desempenhar cargos implica que nos entreguemos a eles e eu faço-o com gosto”.
“Se isso prejudica a minha vida profissional? Sim, por vezes prejudica. Mas costumo recorrer a colegas para me ajudarem nas atividades do meu escritório e a sua colaboração permite-me ter bons níveis de desempenho”, diz.
Depois, explica Marta Marinho, quer a Junta, quer a Banda têm funcionários de muita qualidade, nos quais confia, referindo que isso a deixa à vontade e, de algum modo, mais liberta. Dos dois colegas que trabalham consigo no escritório, diz que, para além de seus colaboradores, são também seus amigos.
“Às pessoas que trabalham na Junta, na Banda ou no escritório, não as olho como funcionárias. Vejo-as, antes, como elementos da minha equipa e, nesse aspeto, estou confortável, porque acho que tenho os/as melhores a trabalhar comigo”, afirma.
Puxar pelas referências identitárias
Marta Marinho licenciou-se em Direito na Universidade Lusíada e fez Mestrado na Universidade do Porto, desenvolvendo tese na área do Direito Constitucional, escolha que, admite, terá a ver com o seu gosto pela política. Em 2017, foi eleita em lista da coligação “Afirmar Amarante”, para a Assembleia Municipal, onde esteve como Deputada e Secretária da Mesa até 2021.
Naquele ano, foi desafiada a candidatar-se à presidência da Junta da União de Freguesias de Olo e Canadelo, tendo vencido as eleições. Mas, reconhece, não foi fácil constituir lista de acordo com a Lei da Paridade porque, disse, “não há muitas mulheres a quererem envolver-se na política e a população é pouca”.
“Não moro em Canadelo, mas passei muitos dias, muitas semanas e meses seguidos da minha vida na aldeia. Os meus avós, quer maternos, quer paternos, são de Canadelo. Celebrei ali muitos natais e os verões vivia-os entre Olo e Canadelo”, referiu a autarca a AM.
Este facto faz com que conheça muito bem as duas antigas freguesias, em acelerada perda de habitantes e que têm, sobretudo Canadelo, uma população muita envelhecida e com uma grande dependência da autarquia. E a Junta, segundo Marta Marinho, ajuda em tudo: seja no transporte de moradores, no pagamento de faturas, na marcação de consultas, no recebimento das reformas e pensões, ou, mesmo, na leitura de cartas remetidas por instituições ou familiares.
A União de Freguesias de Olo e Canadelo tem, hoje, 434 habitantes, 94 dos quais em Canadelo. Em 1960, moravam ali 482 pessoas e em Olo 718. A emigração (interna ou para o estrangeiro) é a grande responsável por este decréscimo, mas é também nas comunidades migrantes daquelas duas antigas freguesias que Marta Marinho deposita algumas esperanças de regeneração.
“Precisamos acarinhar os nossos emigrantes”, reconhece. “E, diz, ainda que, em geral, as segunda e terceira gerações possam não ter intenções de se fixarem nas aldeias, é importante que venham de férias ou em visitas e, por exemplo, invistam na reabilitação das habitações de suas famílias”.
Até há cerca de três anos, em Canadelo não havia nenhuma criança. Hoje, há quatro em idade escolar, graças ao regresso à aldeia de duas famílias de emigrantes.
Apostada em “puxar” pela identidade cultural, pelas referências e pela autoestima da população da sua União de Freguesias – dando como exemplo a celebração de S. Pedro, em Canadelo, a 29 de junho de cada ano – Marta Marinho diz-se “fascinada pela política”, que entende dever ser “feita com proximidade, de forma séria, lado a lado com as pessoas”.
Perguntada se está nos seus planos desempenhar funções de governação para lá das freguesias, percebe-se-lhe um “brilhozinho nos olhos”, mas a resposta é politicamente correta: “Direi que, na política, todos os cargos são importantes, sendo que o que conta é o trabalho e empenho que pomos na resolução dos problemas dos cidadãos. Para já não tenho planos… Só o futuro dirá se virei, ou não, a desempenhar outras funções políticas”.
“Há discriminação na política”

Movimentando-se num meio ainda muito dominado pelos homens, Marta Marinho releva a existência da Lei da Paridade, enquanto “instrumento para trazer mulheres para a política”.
“As mulheres, em geral, têm uma maior capacidade de trabalho, de organização, de gestão, de simplificação e podem fazer a diferença na política. E isso tem a ver com a ordem natural das coisas. Repare-se: a mulher trabalha, é mãe, passa por um parto, é dona de casa…”
E, pela sua exposição pública, alguma vez se sentiu assediada?
“Se se refere a assédio sexual, isso comigo não acontece. Não dou tempo ou oportunidade para que exista. Há pessoas que me tratam como ‘uma presidente de junta bonita’ (como o fez, recentemente, o Presidente da República); que me dizem que tenho uns olhos muito bonitos, mas não vejo nisso qualquer tipo de assédio. Assédio moral, sim. E já apresentei duas queixas-crime por causa de situações dessas. Já ouvi todo o tipo de comentários, do género de que ‘não deveria ser permitido haver mulheres na política’”.
E conclui: “Enquanto advogada, as coisas são diferentes. Até porque somos a maioria na profissão, o mesmo acontecendo na magistratura. Mas na política, sim. Ainda somos discriminadas”!
A paixão pela Banda

Poucos dias após termos falado com Marta Marinho, iniciar-se-ia o Estágio de Verão da Banda Musical de Amarante, que haveria de se prolongar por cinco dias e teria como maestro convidado Franco Cesarini.
O estágio, este ano designado de “Curso de aperfeiçoamento de sopros e percussão”, haveria de reunir cerca de uma centena de jovens músicos de todo o país e incluiu três concertos públicos, que decorreram nos claustros do edifício dos Paços do Concelho: o dos professores, dos alunos e o concerto final, pela orquestra, formada por sete dezenas de executantes e dirigida pelo maestro convidado.
Marta Marinho parecia estar a viver intensamente a iniciativa e, embora segura do seu êxito, notava-se-lhe alguma ansiedade que, todavia, diluía no entusiasmo com que falava da “sua” Banda, onde entrou aos 13 anos para aprender a tocar guitarra. As aulas eram, então, lecionadas na Casa da Cadeia, onde teve como primeiro professor o maestro Hermínio Azevedo, que, um dia, a desafiou a experimentar o clarinete.
E das cordas para o sopro foi um instante, já que, em breve, Marta era executante de clarinete, passando a integrar a formação da Banda Musical de Amarante e a “arrastar” consigo toda a família.
Em 2013, então com 32 anos, Marta Marinho foi eleita presidente da Banda Musical de Amarante (BMA), “a mais antiga associação do concelho, que fará 169 anos em dezembro”, enfatiza, com 900 sócios e o estatuto de Instituição de Utilidade Pública.
Com instalações no edifício do Salto, onde também funciona a sua escola de música, a BMA é a única filarmónica portuguesa financiada pela Direção Geral das Artes, através do projeto “Envelhecimento Ativo”, que junta todas as Instituições Particulares de Solidariedade Social (IPSS) do concelho.
Tendo como atividades, entre outras, o ensino da música, através da sua escola, a realização de concertos pedagógicos e temáticos e a participação em romarias, a Banda Musical de Amarante já mal cabe na sua atual sede.
“Antigamente, celebrávamos aqui o nosso aniversário. Neste momento isso já não é possível”, explica Marta Marinho, que tem em mãos o desafio de arranjar novas instalações, o que espera conseguir a curto prazo.
Em causa está também a criação de uma área museológica, através da qual a Presidente da Banda Musical de Amarante pretende “reconstruir” a história da Instituição, fundada há 169 anos. Espólio, garante, não falta: partituras e instrumentos antigos, fardamentos, fotos, livros e documentos vários.
No horizonte de Marata Marinho está também o seu regresso à Banda, como executante. Enquanto esse desejo não é cumprido, o seu clarinete mantém-se ao serviço da filarmónica, entregue a um jovem músico.
Nota: Esta peça foi publicada, originalmente, na edição em papel nº 38 (Inverno 2024) da revista AMARANTE MAGAZINE.
