A identidade de um povo como estratégia de desenvolvimento local

Foto de Ganta Srinivas. no Pexels.

Com base na ideia expressa na Carta de Cracóvia (2000) de que a identificação e a conservação do património pressupõem um processo de seleção de valores, consideramos que a identidade de um povo e o significado cultural do património surgem associados à atual premissa de que a diversidade cultural constitui, em si mesma, um valor a preservar (Barranha, 2016).

Afinal o que é isto de Identidade de um povo? Podemos dizer que identidade de um povo ou comunidade, segundo a Conferencia Internacional sobre a Conservação (2000), é uma referência coletiva que engloba tanto os valores atuais que emanam dessa comunidade, como os valores autênticos do seu passado. Esta identidade está bem explicita no modo como falamos, como fazemos e como estamos em comunidade e são retratadas nas nossas tradições e rotinas. Contudo quando nos referirmos à identidade cultural de um povo, referimo-nos ao modo através do qual diferentes grupos étnicos, sociais, religiosos ou linguísticos se apercebem das respetivas diferenças. É esta diversidade cultural que tem vindo alimentar a recente procura pelo turismo local, turismo rural e a procura por experiências únicas e diferenciadoras apresentando-se como alternativa ao turismo de massas.

Muito se tem falado de desenvolvimento, mas o que é isto? De uma forma muito simples desenvolvimento é por si só um conceito que se concretiza na simples noção de que algo muda para melhor. O desenvolvimento de uma flor significa que esta cresceu e está mais bonita, o desenvolvimento de uma criança significa que esta está mais matura e possui mais competências, o desenvolvimento de um projeto expressa que se iniciou a concretização da ideia inicial quer no papel quer no terreno (Mendes, 2016). No fundo o conceito de desenvolvimento, é amplo centrando-se na erradicação da pobreza e no desenvolvimento social, tendo como elemento central as pessoas enquanto destinatárias principais dos benefícios desse processo e o homem é visto como um fator de transformação tanto do contexto onde este está inserido como de si mesmo (Morais & Graça, 2014).

Como temos vindo a aperceber-nos os holofotes das diversas formas de fazer turismo estão atualmente virados para o interior geográfico do país, para o rural, para a identidade destas comunidades, para o que é autêntico e diferente, não obstante consideramos que esta mudança tem que trazer consigo, obrigatoriamente, mais valias para estas comunidades e todas as entidades que a compõem. Em suma só faz sentido que tal aconteça se esta diversidade cultural estiver ao serviço do desenvolvimento local.

Nesta época de profunda transformação onde o local é preferível ao global, emerge então a necessidade de se trabalhar a diversidade cultural local inscrita no carácter único e na pluralidade das identidades dos grupos que a compõem e colocá-la ao serviço do desenvolvimento dessas comunidades. Para que tal aconteça, em nosso entender, é necessário:

  • Maior investimento por parte da comunidade, das entidades e do poder local em apoiar diferentes formas de atuar com este propósito social de fundo, que trabalhar em rede, que se preocupam com o bem comum local e que contribuem para um desenvolvimento mais sustentável no sentido de responder às necessidades de hoje, sem deixar de pensar no futuro das novas gerações. 
  • São necessárias políticas de boa governança locais, municipais e regionais, políticas e posturas sociais, que promovam o território com os que estão dentro, que mudem o foco para os seus saberes e modos de fazer. Políticos, mega-associações municipais ou comunidades intermunicipais, redes de promoção do território, devem tomar consciência de que são os habitantes locais e suas entidades (sejam elas pequenas associações ou entidades privadas) os protagonistas. Pois por mais que a sua ação seja gerir fundos comunitários, devem entender que a maior fatia deve, realmente, ser absorvida pela comunidade local em prol do seu desenvolvimento, no fundo estas entidades devem ser apenas as pontes para que o ser e o saber fazer do interior das comunidades se faça sentir à superfície.
  • São necessárias verdadeiras parcerias para o desenvolvimento eu diria são necessárias parcerias sociais, (Mendes, 2016) parcerias entre instituições/organizações que unem recursos e esforços para juntas alcançarem um fim comum. No fundo que seja um ato de unir esforços para a resolução de um assunto ou problema e que, ao cooperar se proporcione a justiça restaurativa (Ngoenha & Castiano, 2011) cuja finalidade é da inclusão social, aquela em que se identifica e se apercebe o outro como um semelhante, em que se reconhece o seu ser, a sua existência, a sua identidade e o seu lugar.
  • É necessário insistir na relação forte entre desenvolvimento e educação, pois a finalidade de ambas na sociedade é o alcance de melhores condições de vida e uma maior humanização. Podemos ver a Educação como consequência, efeito ou benefício do desenvolvimento, não obstante a educação poderá ser também considerada como um fator decisivo para o desenvolvimento, pois ao capacitarmos as pessoas estamos a conferir-lhes maior liberdade na escolha dos seus modos de vida, por exemplo, no sentido de superar situações de pobreza.

Em suma, para trabalhar a identidade de um povo como estratégia de desenvolvimento local é fundamental que se faça sentir no terreno um (1) trabalho comunitário, colaborativo e em prol do desenvolvimento, (2) um diálogo e um conhecimento situado (na concretude do local), (3) uma maior capacidade local de construção endógena de desenvolvimento focada no residentes locais, (4) uma apropriação situacional de políticas e práticas de desenvolvimento e (5) modalidades de cooperação entre entidades e organizações locais, independente, de serem públicas, privadas ou de cor política diferentes, mas que estejam verdadeiramente focadas na resolução de problemas e no desenvolvimento do bem-comum.

Referencias bibliográficas

Carta de Cracóvia (2000). Princípios para a conservação e o restauro do património construído. Cracóvia (polónia), 26 de outubro de 2000.
Barranha, H. (2016). Património cultural: conceitos e critérios fundamentais. Lisboa: IST Press e ICOMOS – Portugal.
Mendes, C. (2016). O caso das Parcerias Sociais entre o Governo e organizações do segundo e terceiro setor no âmbito da educação de adultos em Angola. Tese de Doutoramento apresentada à Universidade Católica Portuguesa. Portugal 
Morais, L. & Graça, L. (2014). Dicionário de Gestão & Desenvolvimento para a Lusofonia. Lisboa: Escolar Editora.
Ngoenha, S. & Castiano, J. (2011). Pensamento engajado: ensaios sobre filosofia africana, educação e cultura.Editora Educar: Centro de Estudos Moçambicanos e Etnocêntricos (CEMEC) Universidade Pedagógica: Moçambique.

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