Stay to Talk: três anos de essência, de trabalho colaborativo em comunidade

Stay to Talk celebrou o seu 3º Aniversário.

No passado dia 6 de julho, o Stay to Talk – Instituto de Imersão Cultural celebrou o seu aniversário. Três anos a caminhar num trajeto que se tem mostrado aliciante e desafiador, com encontros e desencontros ao longo do qual vamos respondendo com uma postura resiliente, inovadora e sempre sedentos de “fazer acontecer”. Poderia aproveitar a oportunidade para vos contar a nossa experiência e a enorme resiliência com que temos enfrentado este caminho, mas não o vou fazer, pois se assim entenderem, poderão conhecer-nos melhor pelas redes sociais e pelo site[1] que lançamos neste evento híbrido, realizado via streaming[2] no exterior da Casa da Juventude, em Amarante, na presença de alguns convidados e parceiros.

Propomos antes chamar-vos a esta reflexão e connosco abordar algo mais importante, mais profundo, falar-vos do propósito que nos define, que justifica o nosso trabalho e a nossa ação – a essência. “A essência humana para Feuerbach é aquilo que define o homem e, por sua vez só pode ser algo que produz dentro do próprio humano” (Silva & Feldhaus, 2018, p.286). Todos nós sabemos que quando nascemos trazemos já connosco a nossa essência, enquanto a personalidade de cada um vai sendo adquirida pelo meio em que vivemos, pelo contexto onde vamos tendo as nossas experiências e interações com os que nos rodeiam. A essência somos nós próprios, enquanto a nossa personalidade acaba por ser a capa com que nos cobrimos e que é reconhecida por todos.

Neste sentido, quando a equipa concebeu o projeto Stay to Talk Instituto, assente num novo modelo de negócio e que iniciou o seu trabalho há três anos, identificou perfeitamente a sua essência, não viéssemos nós do voluntariado, das ONG’s e da cooperação internacional. Teria de ser um projeto que nos desse a possibilidade de realizar um trabalho social, comunitário e sempre com um propósito, no entanto, aquando da procura da sua configuração/personalidade jurídica em Portugal, não encontrou a “capa” que lhe servisse, pois ao querer atuar no setor social, mas não sendo uma IPSS ou uma associação mutualista, acaba por não corresponder a “qualquer regulação jurídica própria que as encare como um conjunto dotado de uma identidade específica” (Namorado, s.d., p.25). Desta feita temos vindo a construir a nossa personalidade com a comunidade onde nos alocamos, no entanto, por mais saraus[3] (encontros comunitários) que temos vindo a realizar pelas freguesias (agora parados devido à pandemia) e a nossa “Birinha”[4] repetidamente tenha esclarecido o que é o Stay to Talk, ainda vamos encontrando na comunidade quem tenha dificuldade em entender o que é realmente o Stay to Talk Instituto, talvez porque a nossa “personalidade” não encaixe nas “gavetas” do regime jurídico tradicional que temos em Portugal. Estas são as dificuldades de quem se arrisca a inovar e pretende desenvolver respostas que possam, desde já, satisfazer o futuro que está aí à porta.

É verdade o Stay to Talk é uma empresa não é uma associação, é empresa pois queremos ser nós os responsáveis por todos os nossos atos, pelos riscos, pelas decisões, pela nossa sustentabilidade, desafiando-nos todos os dias a sair da cama e procurar ser os mais criativos possíveis nas ações, nos projetos e nas parcerias que estabelecemos. Além disso, queremos ser uma empresa social[5], mas limitamo-nos a ser uma empresa de impacto social, uma empresa que justifica a sua ação num trabalho conjunto e de proximidade com a comunidade, de parcerias com as demais entidades para que no final das contas possa redistribuir os seus lucros com a comunidade ao responder aos seus problemas, às suas necessidades, aos seus desafios através de eventos, encontros, formação, atividades no seu território que tão bem conhece. No fundo estar no Stay to Talk é estar “tal como sou”, como dizíamos no nosso segundo aniversário[6], acaba por ser uma forma de estar na sociedade, uma filosofia de vida pois fazemos o que gostamos, com as pessoas da nossa terra e no final todos nós acabamos por ganhar algo. Se tivéssemos sede na Europa seriamos empresas sociais, como estamos em Portugal somos uma empresa de impacto social, aquela que quer fazer a diferença na sua comunidade trabalhando com e para a comunidade, contribuindo para o desenvolvimento económico-social local.

Tem sido com base na nossa essência, na personalidade que vamos edificando através de trabalho colaborativo que, no último ano e meio, imersos em contexto pandémico encontrámos a nossa comunidade desanimada, com discursos e ações mais nublados, sem energia e sem esperança num futuro mais promissor. Então decidimos atuar e, através de uma iniciativa social, fazer de tudo para passar uma mensagem positiva e contribuir para o redescobrir dessa esperança. Ora sendo a cultura, uma das nossas áreas de atuação na região, decidimos desafiar, em ato solidário, um conjunto de pessoas e respetivas instituições a fazer acontecer e não ficar à espera que algo mude envoltas em inércia.

No atual contexto, como diz Dom José Tolentino Mendoça (2020), tem sido necessário encontrar parábolas, pois não temos chaves interpretativas para lidar interiormente com a situação que enfrentamos, não só para nos dar ferramentas narrativas para podermos contar, a nós mesmos e aos outros, o que está acontecer e, dizemos nós, para descrever como fomos idealizando esta iniciativa comunitária que sai da nossa região para se fazer ouvir o mais longe possível face à dimensão global desta situação social. Neste sentido, tal como o frade de Almeirim que em tempos fez a Sopa da Pedra, o Stay to Talk agarrou na enorme vontade de fazer acontecer, de passar uma mensagem de esperança, de afirmar que novos e melhores tempos virão e, com ela foi batendo à porta de diferentes pessoas/instituições com o objetivo de conseguir os ingredientes necessários para uma sopa motivacional pós-pandémica.  “Redescobrir a Esperança” é uma iniciativa social coordenada pelo Stay to Talk que emerge da comunidade do Tâmega e Sousa e que, em uníssono, anuncia novos tempos e ergue a voz num hino a uma nova esperança. Seja você uma dessas vozes e partilhe o máximo que puder esta canção que nos acalenta a alma.

“Parece paradoxal, mas o tempo presente representa também uma oportunidade para nos reencontrarmos. Confinados a um isolamento compreendemos talvez melhor o que significa ser – e ser de forma radical – uma comunidade. A nossa vida não depende apenas de nós e das nossas escolhas: todos estamos nas mãos uns dos outros (…)” (Mendonça, T., 2020) e tem sido nesta perspetiva que todo o trabalho do Stay to Talk Instituto tem sido realizado ao longo destes três anos, coerentes com a nossa essência, a edificar a nossa personalidade para que, paulatinamente, consigamos ser entendidos como uma entidade diferente, multidisciplinar, que se funde com a comunidade e lhe é útil no projetar da sua identidade e na construção de dinâmicas sociais locais.

Referências Bibliográficas

BARATA, F. (2014). A empresa Social. In o Jornal Económico. Retirado de: https://jornaleconomico.sapo.pt/noticias/a-empresa-social-7327
NAMORADO, R. (s.d.). Os quadros jurídicos da Economia Social-uma introdução ao caso português. Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra e Centro de Estudos Sociais. Retirado de https://eg.uc.pt/bitstream/10316/11113/1/Os%20quadros%20jur%C3%ADdicos%20da%20economia%20social.pdf
SILVA & FELDHAUS (2018). O conceito de essência humana a partir da concepção antropológica de Ludwig Feuerbach.Retirado de http://www.periodicos.ufc.br/dialectus/article/view/33212


[1] https://www.staytotalk.pt/

[2] https://www.youtube.com/watch?v=ZFf7_Lx1UNo

[3] https://amarantemagazine.sapo.pt/evento/sarau-stay-to-talk-travanca/

[4] https://www.facebook.com/1226167397517906/videos/467609990453119

[5] O conceito de empresa social ou negócio social idealizado por seu fundador, Muhammad Yunus (o banqueiro dos pobres), está intrinsecamente relacionado com pelo menos três ideias básicas: a questão da pobreza; a questão da natureza humana e a auto-sustentabilidade do negócio. Segundo o Regulamento (EU) n.º 346/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 17 de abril de 2013, Empresa Social deverá ser definida como “um operador da economia social cujo objetivo principal, mais do que gerar lucros para os seus proprietários ou sócios, é ter uma incidência social. Opera no mercado fornecendo bens e serviços e utiliza os seus lucros essencialmente para atingir objetivos sociais. É gerida de forma responsável e transparente, nomeadamente através da participação de empregados, consumidores e outros interessados abrangidos pela sua atividade comercial.” O conceito é amplo e transversal o suficiente. Cabe aguardar a criação de um regime jurídico “taylor made” das empresas sociais, enquanto entidades que desenvolvem uma atividade comercial com fins primordialmente sociais e cujos excedentes são essencialmente mobilizados para o desenvolvimento daqueles fins ou reinvestidos na Comunidade” (Barata, 2014).

[6] https://www.youtube.com/watch?v=su-sD9vDjDM

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