“Maria Eulália Macedo – escreveu Maria João Reynaud – pertence a uma família de escritores, onde destaco Sophia de Mello Breyner Andersen e Maria Ondina Braga. Escritores que retiram da imanência o sentido último da sua escrita, fazendo dela o espelho profundo da precariedade da própria vida”.
Se fosse viva, Eulália Macedo faria, no próximo domingo, 21 de março, quando (propositadamente?) se celebra o Dia Mundial da Poesia, 100 anos de idade.
Figura grande da Amarante contemporânea, Eulália Macedo morreria em 2011, alguns meses depois de, a 8 de julho daquele ano, ter sido homenageada pelo Município que, em cerimónia pública, a distinguiu com a atribuição da Medalha de Honra. Presidente da autarquia, à data, Armindo Abreu justificaria a condecoração “pelos serviços excecionais e relevantes que Eulália Macedo prestou ao Município: como poeta, escritora, como pedagoga e cidadã”.
Então, no Salão Nobre do edifício dos Paços do Concelho juntaram-se familiares, amigos, ex-alunos e admiradores da homenageada que, na sua intervenção, haveria de agradecer a distinção e recordar os tempos em que privou com figuras amarantinas como Alexandre Pinheiro Torres ou Teixeira de Pascoaes, decisivos, disse, na forma como construiu a sua visão do mundo.
“Os Pascoaes tinham uma estrela na testa”, referiu, citando Almada Negreiros, para realçar a figura de Maria de Pascoaes, “uma mulher ímpar, extraordinária, mas nem sempre reconhecida”, acrescentou, relevando, ainda, do seu circulo de amigos, “o grande Augusto Barros”, médico muito próximo de Alexandre Pinheiro Torres e companheiro de inúmeras tertúlias à mesa da poesia.
Uma referência muito especial quis deixar Eulália Macedo, na cerimónia em que foi agraciada com o título de “Cidadã Honorária de Amarante”, às “mulheres da (sua) minha rua, mulheres humildes, lutadoras, que pariam filhos em silêncio, a quem, muitas vezes, a doença minava, mas que resistiam, sorrindo ao destino”.
Eulália Macedo não concebia a escrita separada da vida
Maria João Reynaud, Professora da Faculdade de Letras da Universidade do Porto, estudiosa de Eulália Macedo e que havia promovido a reedição do livro “Histórias de poucas palavras” escreveu que “(…) falar da escrita de Eulália Macedo é também destacar o que nela é manifestamente indeclinável do amor pelos Outros; ou de uma atenção constante e fraterna ao sofrimento humano. Há, fundamentalmente, dois tipos de escritores: os que vivem a criação literária como uma segunda vida – uma vida Outra – em que buscam a transcendência através de uma depuração obstinada; e os que não concebem a escrita separada da vida, assumindo nela a impureza do mundo e a dualidade do ser.
Maria Eulália Macedo pertence a esta segunda família de escritores, onde destaco Sophia de Mello Breyner Andersen e Maria Ondina Braga. Escritores que retiram da imanência o sentido último da sua escrita, fazendo dela o espelho profundo da precariedade da própria vida. Na sua obra extremamente pessoal, a grandeza e a miséria, a alegria e a dor, a beleza e a fealdade são a faces reversíveis da verdade humana. As raízes da sua escrita mergulham no húmus amarantino, para dele retirar a força redentora que lhe confere um sentido maior (1)”.
Maria Eulália Macedo escreveu “Construções do Vento Norte” (1968); “Raizes” (1970); “Histórias de Poucas Palavras” (1972) e “As Moradas Terrenas” (1994), tendo colaborado em jornais e revistas, com muitos escritos dispersos.
(1) in AMARANTE MUNICIPAL, nº 18, dezembro de 2011, pp-10,11.